Roberto Freitas – Divulgação.
Mostras simbolizam um novo voo para ambos os artistas
As mostras inéditas “O som que faz fechar os olhos ou toda essa luz que ronda nossas cabeças”, de Roberto Freitas, e “Cuidado com quem fecha a janela para nos falar da paisagem”, de Bruno Lyfe, ficam em cartaz até 1º de março na dotART galeria. As exposições partem de locais bastante distintos. Roberto trabalha a partir de uma pesquisa realizada em Bruxelas, onde mora atualmente, e Bruno traz recortes da sua vivência em Ramos, bairro da zona norte do Rio de Janeiro.
Wilson Lázaro, diretor artístico da dotART, ressalta como as mostras simbolizam um novo voo para ambos os artistas: “O Roberto se mudou e agora está morando na Bélgica, fazendo uma carreira internacional, então teve que se readaptar e se reinventar. E o Bruno inaugura uma exposição pela primeira vez em Belo Horizonte. Mas as pinturas são muito diferentes, uma é uma pintura quente, que te envolve e te aquece, e a outra é uma pintura fria, que te envolve internamente. Os dois trabalham com cores vibrantes, mas que te convocam de formas distintas”.
Cuidado com quem fecha a janela para nos falar da paisagem – Bruno Lyfe
Na sua primeira exposição individual fora do Rio de Janeiro, Bruno Lyfe reflete sobre as condições históricas e estruturais que moldam as relações com os espaços, as presenças e os movimentos ao redor. As obras expostas partem de fotografias que recebem intervenções diversas do artista e retratam cenas cotidianas do seu local de origem, o bairro Ramos, do Rio de Janeiro.
“São cenas cotidianas, são recortes que são comuns da minha vivência, da minha estética, do local de onde eu venho, do Rio, da zona norte. Eu sempre enxerguei esse espaço como um lugar de potência cultural e estética, que não tinha espaço no circuito de arte majoritário. Então, eu trago esse recorte, não são cenas reais, todas são colagens de fragmentos de fotos que eu tiro, de imagens de amigos meus, que são do meu convívio. Eu crio essas colagens e trabalho em cima delas com cores, formas e abstrações. Na hora de pintar, eu desapego um pouco da referência”, explica o artista.
Os trabalhos são recentes. A série começou a ser construída no ano passado e partiu de uma exposição no Rio, realizada em julho de 2023, que se desdobrou na continuação, agora exposta em Belo Horizonte. O curador Jean Carlos Azuos sintetiza o trabalho: “As pinturas, aqui, se colocam no limite daquilo que pode ser compreendido pela imagem e as coisas que surgem como pistas para as narrativas, que se endereçam às diferentes vivências na articulação entre os repertórios, subjetividades e os saberes, e assim, são catalisadoras para se pensar ampliadamente as leituras sobre arte, território e identidade implicadas aos atravessamentos nos trânsitos e deslocamentos diários”.
O som que faz fechar os olhos ou toda essa luz que ronda nossas cabeças – Roberto Freitas
Natural de Buenos Aires, Roberto atualmente mora em Bruxelas, onde pesquisa principalmente tradições de pintura e das máquinas celibatárias. A mostra é composta por três diferentes momentos que trabalham com a ideia do que escapa, do invisível e do mistério. “O que é inatingível é um dos centros do meu trabalho, flerto com a questão ontológica. Deduzo que é justamente no hiato entre aquilo que é visível e o que não se pode ver, porque não se pode sequer conceber, que reside o que alarga as fronteiras do que chamamos de olhar. Esse alargamento cria os mundos que conhecemos e está neste momento gerando as metamorfoses dos mundos que virão”, comenta.
Na mostra, o artista focou em uma pesquisa sobre o período em que as técnicas de tempera sobre madeira, tradição que atravessou toda a Idade Média no Flandres (hoje Holanda e parte da Bélgica), são substituídas pela pintura a óleo. “Não foi por acaso que ocorreu uma transição técnica estrutural ao mesmo tempo em que morre o homem medieval e nasce o indivíduo moderno”, diz o artista. Ele esmiuçou os museus em busca de compreender o que virou hiato, o que deixou de existir não apenas tecnicamente, mas na construção do imaginário humano. Roberto traz algumas de suas descobertas para as pinturas guache sobre madeira e óleo sobre tela que compõem os dois primeiros momentos da mostra.
No terceiro, o artista traz três máquinas, esculturas que apresentam pinturas a óleo sobre madeira em rotação. Fugidias ao olhar, não se deixam visualizar de forma completa, como comenta o artista: “Nessas esculturas, por mais que você tente apreender o que está pintado ali, você tem uma certa impossibilidade; a pintura foge ao olhar. Ali, uma ideia de impossibilidade se aplica, e aquilo que é invisível se encontra com o que é visível. Essa série de esculturas é a síntese do meu campo de exploração visual e de suas fronteiras”.
Bruno Lyfe
Vive e trabalha em Ramos, bairro do subúrbio do Rio de Janeiro. Teve seu primeiro contato com o campo das artes no final da adolescência, quando conheceu o graffiti. A partir desse contato, buscou qualificação e aprofundamento. Frequentou os cursos de Concepção e Fundamentação oferecidos pela EAV do Parque Lage nos anos de 2012/13 e, em 2018, formou-se na Escola de Belas Artes da UFRJ no curso de Pintura.
Possui linguagem plástica onde a linha e a forma se impõem, em associação com intensos cromatismos, sobreposições e justaposições de elementos numa multiplicidade de acontecimentos em que figura e fundo se transbordam, criando em suas obras uma espécie de colagem. Composições conscientemente pensadas, editadas e fragmentadas, construídas por camadas, enquadramentos e acúmulos.
Bruno Lyfe tem na figuração o primeiro pensamento. Tateia diferentes questões figurativas na edição e construção de imagens, elaborando cenários complexos, figuras que mimetizam o espaço e uma cena que está no limiar entre o corriqueiro e o irreal, através de uma sofisticação técnica. Somada a isso, um particular domínio da construção imagética, e uma cartela quase Pop, mas que finca sua retórica na periferia onde vive e a sua história.
Roberto Freitas
Nascido em 1977, na cidade de Buenos Aires, vive e trabalha em Bruxelas. Em sua trajetória artística, produz trabalhos que flertam livremente com cinema, dança, música, escultura, performance, desenho e pintura, com foco na instalação. É bacharel em artes plásticas e mestre em teoria da arte pela UDESC, tendo realizado residências no Kontakt (Bruxelas 2022/23), Residência Circunvizinhanças (2019, ESPAI, Belo Horizonte), Redbull station (SP 2014), Ja.Ca. (Belo Horizonte, 2013), Bienal Sesc de dança (Santos 2013), Odin treatet (Dinamarca, 2011), entre outras. Realizou apresentações musicais em locais notáveis, como no Teatro Marília (2019, BH), na inauguração do SESC Avenida Paulista (SP, 2018) e no Conservatório Mineiro (BH, 2015), além de dezenas de outros lugares, muitas vezes em parceria com o Grivo. Fez performances na Bienal Sesc de Dança (Campinas 2015), no Pivo (2014, Edifício Copan, SP), na sede do Odin Teatret (Dinamarca 2009) e em muitos festivais de dança e teatro, como o Cervantino (2011, Guanajuato, MX). No campo das exposições individuais, destacam-se “Under watchful eyes, a sound pounds or what to expect from a small flame in the midst of the dark winter.” (2023, GC Kontakt, Bruxelas, Bélgica), “Desejo de Preto ou Como desafinar o coro dos contentes” (2018, Dotart, BH), Sonar (2017, Galeria da Funarte BH), “Hiato velado ou Poema no meio” (2016, Dotart, BH), Três (2013, SESC Pompeia), entre outras. No mundo das mostras coletivas são muitas como “Two Sundays Two Mouths A House” (2021, Rep. of Korea), “Como uma quilha corta as ondas” (2018, Casa Azeitona, BH), “Às vezes é melhor fazer uma sopa” (2016, Saracura, RJ), Brasil Arbeit Und Freund Schaft. (2014, Pivo, Ed. Copan -SP), entre dezenas de outras. Ganhou três vezes o Rumos Itaú Cultural (2009, 2016, 2020), o Prêmio Funarte Conexões Artes Visuais (2015), Prêmio Elisabete Anderle de artes visuais (2015, SC), Prêmio Dans (2007, Bologna, Itália), Prêmio Iberescena em parceria com o Cena11 (2011, América Latina), entre outros.
SERVIÇO:
Exposições: “O som que faz fechar os olhos ou toda essa luz que ronda nossas cabeças”, de Roberto Freitas e “Cuidado com quem fecha a janela para nos falar da paisagem”, de Bruno Lyfe
Visitação: Até 1º de março de 2024
Horário de funcionamento: de segunda a sexta, das 9h às 18h | sábado, das 10h às 13h
Local: dotART galeria (rua Bernardo Guimarães, 911, Savassi, Belo Horizonte)
Entrada gratuita
Informações: (31) 3261-3910
https://www.instagram.com/galeriadotart/
Sobre a dotART
A dotART galeria foi criada pelo casal Feiz e Maria Helena Bahmed na década de 70, hoje dirigida por Leila Gontijo e Wilson Lazaro. É uma galeria de arte pioneira na divulgação e promoção da arte em Belo Horizonte, no estado de Minas Gerais, apresentando uma arte vanguardista com grandes apostas para o cenário cultural da cidade como Volpi, Ianelli e Mabe e Tomie Ohtake.
Fez de seu espaço um lugar para ser, pensar, produzir, experimentar, celebrar e comercializar a arte de uma forma poética. Isso possibilita, ao longo de sua trajetória, uma maior eficácia na relação entre o espectador e o objeto de arte em foco.
Através da sua programação de exposições constantemente, apresentou aos mineiros um elenco de criadores com diferentes linguagens e suportes. A larga experiência e seriedade na parceria com novos valores fizeram da galeria também um posto avançado da produção mais atual da arte no Brasil e no mundo. Ao longo desses mais de 40 anos, vários artistas já passaram pela galeria, que tem um acervo cuidadoso e especial que transita entre o acadêmico, moderno e o contemporâneo.